ADIÇÕES DOS EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS

PARA MAIS DEPRESSA TIRAR AQUELE PECADO OU DEFEITO PARTICULAR

27 Primeira adição. Cada vez que a pessoa cair naquele pecado ou defeito particular, ponha a mão no peito, doendo-se de ter caído; o que se pode fazer mesmo diante de muitas pessoas, sem que notem o que faz.

28 Segunda adição. Como a primeira linha do g= significa o primeiro exame e a segunda linha o segundo, veja, à noite, se há emenda, da primeira linha para a segunda, a saber: do primeiro exame para o segundo.

29 Terceira adição. Conferir o segundo dia com o primeiro, a saber: os dois exames do dia presente com os outros dois exames do dia passado, e verificar se, de um dia para o outro, se emendou.

30 Quarta adição. Conferir uma semana com a outra, e verificar se emendou, na semana presente, em comparação com a semana passada.

31 Nota. Note-se que o primeiro g= grande que se segue significa o domingo; o segundo menor, a segunda-feira; o terceiro, a terça-feira; e assim sucessivamente.
G
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g
g
g
g
g

PARA MELHOR SE FAZER OS EXERCÍCIOS E MELHOR SE ACHAR O QUE DESEJA

73 Primeira. Depois de deitado, antes de adormecer, pensar, por espaço de uma ave-maria, a que hora tenho de me levantar e para quê, resumindo o exercício que tenho de fazer.

74 Segunda. Quando despertar, não dando lugar a outros pensamentos, advertir logo no que vou contemplar no primeiro exercício da meia noite, excitando-me a confusão de tantos pecados meus, propondo exemplos: como se um cavaleiro se achasse diante de seu rei e de
toda a sua corte, envergonhado e confundido de muito ter ofendido aquele de quem antes recebeu muitos dons e muitas mercês. E assim mesmo, no segundo exercício, reconhecer-me um grande pecador e que vou, algemado, isto é, preso com cadeias, comparecer diante do sumo e eterno Juiz, lembrando para exemplo, como os encarcerados e algemados, e já merecedores de morte, comparecem ante seu juiz temporal. E, com estes pensamentos, vestir-me; ou com outros, conforme a matéria proposta.

75 Terceira. A um passo ou dois do lugar onde tenho de meditar ou contemplar, pôr-me de pé, por espaço de um pai-nosso, levantado o espírito ao alto, considerando como Deus nosso Senhor me olha, etc; e fazer uma reverência ou uma genuflexão.

76 Quarta. Entrar na contemplação, ora de joelhos, ora prostrado em terra, ora deitado de rosto para cima, ora sentado, ora de pé, andando sempre a buscar o que quero. Advertiremos em duas coisas:
– A primeira é que se acho o que quero, de joelhos, não passarei adiante, e se prostrado, do mesmo modo, etc.
– A segunda, que no ponto em que achar o que quero, aí repousarei, sem ter ânsia de passar adiante, até que me satisfaça [254].

77 Quinta. Depois de acabado o exercício, por espaço de um quarto de hora, ou sentado ou passeando, observarei como me correram as coisas na contemplação ou meditação. E, se mal, examinarei a causa donde procede, e uma vez descoberta, arrepender-me-ei, para me emendar daí em diante. E, se bem, darei graças a Deus nosso Senhor e farei, outra vez, da mesma maneira.

78 Sexta. Não querer pensar em coisas de prazer ou alegria, como de glória, ressurreição, etc; porque, para sentir pena, dor e lágrimas pelos nossos pecados, o impede qualquer consideração de gozo e alegria; mas Ter antes em mente o querer sentir dor e pena, trazendo mais na memória a morte e o juízo.

79 Sétima. Privar-me de toda a claridade, para o mesmo fim, fechando janelas e portas, o tempo que estiver no quarto, a não ser para rezar, ler e comer.

80 Oitava. Não rir nem dizer coisa que provoque o riso.

81 Nona. Refrear a vista, exceto ao receber ou despedir a pessoa com quem falar.

82 Décima. Sobre a penitência, a qual se divide em interna e externa.

A interna é doer-se de seus pecados, com firme propósito de não cometer esses nem quaisquer outros.
A externa, ou fruto da primeira é castigo dos pecados cometidos. E, pratica-se, principalmente, de três maneiras:

83 A primeira: Sobre o comer, a saber: quando tiramos o supérfluo, não é penitência, mas temperança; penitência é quando tiramos do conveniente. E, quanto mais e
mais, maior e melhor, contando que não se arruíne a pessoa, nem se siga enfermidade notável.

84 A segunda: Sobre o modo de dormir. E também não é penitência tirar o supérfluo de coisas delicadas ou moles. Mas é penitência quando no modo de dormir se tira do conveniente; e quanto mais e mais, melhor, contanto que não se arruíne a pessoa, nem se siga enfermidade notável, nem muito menos se tire do sono conveniente, a não ser que, por ventura, tenha hábito vicioso de dormir demasiado, para chegar à justa medida.

85 A terceira: Castigar a carne, a saber, dando-lhe dor sensível, a qual se dá, trazendo cilícios ou cordas ou barras de ferro sobre a carne, flagelando-se ou ferindo-se e outras formas de aspereza.

86 Nota. O que parece mais prático e mais seguro na penitência é que a dor seja sensível na carne, mas que não penetre nos ossos; de maneira que cause dor e não enfermidade. Pelo que, parece que é mais conveniente flagelar-se com cordas delgadas que dão dor por fora, e não de outra maneira que cause enfermidade notável por dentro.

87 Primeira nota. As penitências exteriores se fazem principalmente para três efeitos:

   - primeiro. para satisfação dos pecados passados;

   - segundo. para vencer-se a si mesmo, a saber, para que a sensualidade obedeça à razão e todas as partes inferiores estejam mais sujeitas às superiores;

   - terceiro. para buscar e achar alguma graça ou dom que a pessoa quer e deseja, como, por exemplo, se deseja ter interna contrição de seus pecados, ou chorar muito sobre eles ou sobre as penas e dores que Cristo nosso Senhor passava na sua Paixão, ou para solução de alguma dúvida em que a pessoa se acha.

88 Segunda nota. A primeira e segunda adição se hão de fazer para os exercícios da meia noite e da manhã, e não para os que se fará noutros tempos; e a quarta adição nunca se fará na igreja, diante de outras pessoas, mas em particular, como por exemplo, em casa, etc.

89 Terceira nota. Quando a pessoa que se exercita ainda não acha o que deseja, como lágrimas, consolações, etc., muitas vezes é proveitoso fazer mudança no comer, no dormir, e noutros modos de fazer penitência; de maneira que nos mudemos, fazendo, dois ou três dias, penitência, e outros dois ou três, não; porque a alguns convém fazer mais penitência e a outros menos; e também porque, muitas vezes, deixamos de fazer penitência, por amor dos sentidos e por juízo errôneo de que a pessoa não a poderá tolerar sem notável enfermidade; e, outras vezes, pelo contrário, fazemos demasiada, pensando que o corpo a possa suportar; e, como Deus nosso Senhor conhece infinitamente melhor a nossa natureza, muitas vezes, nas tais mudanças, dá a sentir a cada um o que lhe convém.

90 Quarta nota. O exame particular se faça para tirar defeitos e negligências nos exercícios e adições; e o mesmo se diga na segunda, terceira e quarta semana.

TRÊS MODOS DE ORAR

PRIMEIRO MODO DE ORAR

238 A primeira maneira de orar é sobre os dez mandamentos e os sete pecados mortais, as três potências da alma, e os cinco sentidos corporais. Esta maneira de orar consiste mais em dar forma, modo e exercícios com que a alma se prepare e tire proveito deles e para que a oração seja aceite do que dar uma forma ou maneira de fazer oração.

239 Primeiro. Faça-se o equivalente à segunda adição da segunda semana [131; 130,2; 75], a saber, antes de entrar na oração, repouse, um pouco, o espírito, assentando-se ou passeando, como melhor lhe parecer, considerando aonde vou e a quê. E esta mesma adição se fará ao princípio de todos os modos de orar [250, 258].

240 Uma oração preparatória. como por exemplo, pedir graça a Deus nosso Senhor, para que possa conhecer no que faltei aos dez mandamentos; e, também pedir graça e ajuda para doravante me emendar, pedindo perfeita inteligência deles, para melhor os guardar e para maior glória e louvor de sua divina Majestade.

241 Para o primeiro modo de orar, convém considerar e pensar, no primeiro mandamento, como o tenho guardado e em que tenho faltado; tendo como norma demorar nesta consideração o tempo de quem reza três pai nossos e três ave-marias. E se, neste tempo, acho faltas minhas, pedir vênia e perdão delas, e dizer um Pai Nosso. E, desta mesma maneira se faça em cada um de todos os dez Mandamentos.

242 Primeira nota. É de notar que, quando uma pessoa vier a pensar num mandamento no qual acha que não tem hábito nenhum de pecar, não é necessário que se detenha tanto tempo. Mas, conforme a pessoa acha que tropeça mais ou menos num mandamento, assim deve deter-se mais ou menos na consideração e exame dele. E o mesmo se observe nos pecados mortais.

243Segunda nota. Depois de terminar a reflexão, como já se disse, sobre todos os Mandamentos, acusando-se neles e pedindo graça e ajuda para se emendar no futuro, há de acabar-se com um colóquio a Deus nosso Senhor, conforme a matéria proposta [257].

244 Segundo. Sobre os pecados capitais. Sobre os sete pecados mortais [238], depois da adição [239], faça-se a oração preparatória, pela maneira já indicada [240], mudando só a matéria que aqui é de pecados que se hão de evitar, e antes era de mandamentos que se hão de guardar. Guarde-se igualmente a ordem e a regra já indicadas e o colóquio [241-243].

245 Nota. Para melhor conhecer as faltas cometidas nos pecados mortais, considerem-se os seus contrários. E, assim, para melhor evitá-los, proponha e procure a pessoa, com santos exercícios, adquirir e ter as sete virtudes a elas contrárias.

246 Terceiro. Sobre as potências da alma. Modo. Nas três potências da alma, observe-se a mesma ordem e regra que nos mandamentos, fazendo a adição, a oração preparatória e o colóquio [239-243].

247 Quarto. Sobre os cinco sentidos corporais. Modo. Nos cinco sentidos corporais ter-seá sempre a mesma ordem, mudando-se a matéria.

248 Nota. Quem quer imitar, no uso de seus sentidos, a Cristo nosso Senhor, encomende-se na oração preparatória a sua divina majestade e, depois de ter considerado em cada sentido, diga uma ave-maria ou um pai-nosso; e quem quiser imitar, no uso dos sentidos, a nossa Senhora, na oração preparatória encomende-se a ela, para que lhe alcance graça de seu Filho e Senhor para isso e, depois de ter considerado em cada sentido, diga uma Ave Maria.

SEGUNDO MODO DE ORAR

249 é contemplar a significação de cada palavra da oração.
250 A mesma adição que se fez no primeiro modo [239], se fará neste segundo.
251 A oração preparatória [240], far-se-á conforme a pessoa a quem se dirige a oração.
252 O segundo modo de orar é que a pessoa, estando de joelhos ou sentada, conforme ache melhor disposição e encontre mais devoção, tendo os olhos fechados ou fixos num lugar, sem andar vagueando com eles, diga: Pai. E esteja na consideração desta palavra, tanto tempo quanto ache significações, comparações, gostos e consolação em considerações pertinentes a essa palavra. E faça da mesma maneira em cada palavra do Pai nosso ou de qualquer outra oração que desta maneira quiser orar.

253 A primeira regra. Estará, da maneira já dita, uma hora em todo o Pai Nosso. Acabado este, dirá uma Ave-maria, um Credo, uma Alma de Cristo e uma Salve Rainha, vocal ou mentalmente, segundo a maneira habitual.

254 A segunda regra. Se a pessoa que contempla o Pai Nosso achar, numa palavra ou em duas, boa matéria para pensar e gosto e consolação, não se preocupe com passar adiante, ainda que se acabe a hora naquilo que acha [76,3]. Terminada esta, dirá o resto do Pai Nosso da maneira habitual.

255 A terceira regra. Se numa palavra ou duas do Pai Nosso se detiver durante uma hora inteira, noutro dia, quando quiser voltar à oração, diga a palavra ou palavras já oradas, conforme costuma, e, comece a contemplar na palavra que se lhe segue imediatamente, como se disse na segunda regra [254].

256 Primeira nota. É de advertir que acabado o Pai Nosso, num ou em muitos dias, se há de fazer o mesmo com a ave-maria e, depois, com as outras orações, de forma que, por um certo tempo, sempre se exercite numa delas.

257 Segunda nota. Acabada a oração, dirigindo-se, em poucas palavras, à pessoa a quem orou, lhe peça as virtudes ou graças de que julga ter mais necessidade.

TERCEIRO MODO DE ORAR

258 Será por compasso de respiração. A adição será a mesma que no primeiro e segundo modo de orar [239, 250]. A oração preparatória será como no segundo modo de orar [251, 240]. O terceiro modo de orar é que, a cada alento ou respiração, se há de orar mentalmente, dizendo uma palavra do Pai Nosso ou de outra oração que se reze, de maneira que se diga uma só palavra entre uma respiração e outra; e, durante o tempo duma respiração à outra, se atenda principalmente à significação dessa palavra, ou à pessoa a quem reza, ou à baixeza de si mesmo, ou à diferença entre tanta alteza e tanta baixeza própria; com a mesma forma e regra procederá nas outras palavras do Pai Nosso; e as outras orações, a saber, ave-maria, Alma de Cristo, Credo e salve-rainha, as rezará como costuma.

259 Primeira regra. No dia seguinte, ou noutra hora que deseje orar, diga a Ave Maria por compasso, e as outras orações, como costuma; e assim sucessivamente proceda nas outras orações.

260 Segunda regra. Quem quiser deter-se mais na oração por compasso, pode dizer todas as orações sobreditas ou parte delas, seguindo a mesma maneira da respiração por compasso, como está explicado [258].